Ouviu-se um ataque na vila. Como alguém atrevia-se a
perturbar a paz da vila, para sempre pequena e segura? A vila dos meninos assustados.
Pequenos, de cabeças enormemente grandes e olhos esbugalhados, que correram
para ver a criatura. No início era pequena, alguns disseram, mas conforme as
flechas dos primeiros meninos a atingiram, seu tamanho aumentou, chegando a
dimensões imensas e tomando com seu corpo a altura das nuvens. Era um monstro.
Sua pele, áspera, possuía um azul turquesa fortíssimo; seus dentes, eram
apontados como serras e possuía uma enorme cauda que se balançava com força. No
entanto, ela não se movia.
Atemorizados e impotentes, os meninos reuniram-se para
saberem como combateriam tamanho ameaça. Até que um deles exclamou: seu tamanho
cresceu com nosso ódio, talvez, com nosso afeto, ela possa diminuir! Assim,
todos os dias, cada menino de cada casa, prontificava-se para oferecer flores e
comida a grande criatura. Porém, passou-se o tempo e a mesma, embora não se
movesse, não alterava seu tamanho. Um deles então, o mais alto e lânguido,
resolveu enfim enfrentá-la e com ímpeto subiu sobre as costas do monstro. Vendo
isso, todos os outros saíram de suas casas e começaram a atirar, um a um, qualquer
peça que encontravam em mãos. Agora, finalmente, ela seria derrotada!
O medo. Você já parou para pensar sobre ele? Não. Nós
somente nos limitamos a senti-lo nos momentos de tensão ou ameaça. Mas uma
ideia errada sobre este sentimento, é a de que ele nos causa a paralisia.
Quando na verdade, muitas vezes, ele é o grande motivador da maioria de nossas
ações. E ele pode vir de diferentes formas, não apenas, no receio do dano
físico, mas moral, espiritual, medo de ser visto como realmente somos.
Quando iniciei essa coluna, há quase dois anos atrás, eu já
estava preparada para o que iria enfrentar, afinal, estabelecer um padrão de
qualidade em meio a um mar de confusão e imaturidade não poderia causar menos
do que a indignação de muitos. Mas se tem algo que eu não poderia sequer prever
seria o estranho fenômeno: assim que viram que seus ataques não surtiam efeito
e que essa coluna apenas aumentava seu reconhecimento, muitos autores mudaram
sua estratégia. De repente, o que eram xingamentos e ódio interminável,
substituiu-se por um abrupto e absoluto silêncio. Logo, a prepotência que os
faziam vociferar em meus comentários, transformou-se em uma concordância doce e
obediente, quase que unânime!
Não quero bancar aquela que prevê tudo aqui. No começo,
confesso, acreditei nisso. Talvez, a esperança de que finalmente meu propósito
estava sendo entendido, tenha me cegado um pouco. Mas assim que isso se
estendeu por um bom período de tempo, ficou evidente para mim. Portanto, o
ocorrido em minha crítica de “Amores passados” serviu apenas para confirmar uma
certeza que eu já tinha. Aqueles autores, não todos é claro, nunca haviam
conseguido realmente entender minhas críticas ou sequer engoli-las, eles
somente não sabiam mais como combatê-las. E assim que o primeiro resolveu se
arriscar, todos o seguiram, extasiados, como um povo faminto que finalmente vê
chegar o seu libertador.
Sim, a imagem é ridícula. Mas é este precisamente o efeito
que causa o ódio e rancor reprimidos, que pela mínima chance que vê de tomar
vingança sobre o seu “causador”, se agarra a ela com lágrimas de alegria e
alivio.
Mas então você pode estar se perguntando: que mal tão grande
essas pobres vítimas foram acometidas? A que monstruosidades elas foram
expostas? E isso nos leva ao tema inicial, pois, muitos mais que o sentimento
de frustração de ter sua obra analisada e julgada como insuficiente ou ruim,
está o terrível e indizível pavor de ver a si mesmo. Não somente de ser visto,
em suas falhas e defeitos, mas o de ver-se, a si próprio, em sua completa
inabilidade e ter que encarar de frente o ódio que sente dela. Em outras
palavras, mais que o medo da luz, o medo do espelho.
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Notas DIGG TV
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2. As opiniões expressas nessa coluna não refletem necessariamente as da DIGG TV. Elas são de total responsabilidade do autor.
3. Este quadro não tem como intuito rebaixar ou menosprezar qualquer autor ou obra, mas sim, de abrir um diálogo em prol da qualidade literária.
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